domingo, 14 de março de 2010

PRODUTO

Na peça PRODUTO, de Mark Revenhill com tradução de Rachel Bipani, em cartaz no Teatro Poeira, temos uma história muito interessante de um diretor que conta para uma atriz famosa o roteiro de um filme que ele irá dirigir brevemente, caso "os deuses do patrocínio" resolvam investir naquela história. O personagem principal, vivido por Ary Coslov, pode ser que esteja a beira de um conflito em sua carreira: ou ele faz esse filme de qualquer maneira por ser a ultima oportunidade que os patrocinadores estão oferecendo a ele, ou ele não faz este filme e ficará pra sempre à sombra do que ele foi no passado e atualmente desacreditado do meio cinematográfico. Pra isso ele conta com a ajuda de uma atriz famosa para que, ao tentar convencê-la, ela aceite fazer o filme e ele volte aos holofotes.

Se o filme vai sair ou nao vai sair, pouco importa. O amor do personagem em contar aquele roteiro, a sua tentativa de convencer a moça a fazer o filme é que é a propria peça. Existe milhões de alternativas para as vidas daqueles seres humanos ali no palco: (diretor e atriz) pode ser que ela tambem esteja em decadencia e, fazer aquele filme, seja sua tábua de salvação. Quem vai saber?

A adaptação do original é muito criativa e competente, pois, embora as referencias sejam todas americanas do norte, conseguimos compreender todos os movimentos e entrelinhas usados no texto para criticar, ironizar e brincar com o que temos visto hoje em dia no cinema.

A direção do Marcelo Aquino, permite aos atores, principalmente ao Ary Coslov, uma criação de um personagem que, ao contar a história, envolve não só a atriz, como todo o publico. É muito dificil contar uma história e prender a atenção do publico, mas o Marcelo faz com que Ary se sinta a vontade e seguro para tal. A opção de só ter duas poltronas como cenário (de Marcos Flaksman) é mais que acertada. Tudo está em nossa cabeça, nós é que vamos construir nossos cenários de acordo com aquele roteiro que Ary está nos lendo. Uma direção que permite aos atores usufruirem daquilo que têm de melhor.

O figurino de Rô Nascimento é a roupa mais confortável e bem vestida que os atores podem usar, pois estão de dia dentro de um escritório de um diretor. Ambos vestidos para uma reunião de trabalho. A luz de Aurélio de Simone destaca as poltronas e não interfere muito na história. Já a trilha sonora, criação do proprio Ary Coslov, é irônica, divertida e sarcástica. Ilustra com perfeição locais, épocas e acontecimentos históricos.

Gabriela Munhoz interpreta uma Olívia que se assusta, se diverte, se ilude, se entrega ao diretor apenas com gestos. Ela nao fala. Mas, falar pra que? Gestos falam mais que palavras. Seja num movimento do pé, uma negação com a cabeça, um olho de soslaio. É um papel dificil, pois a estrela é o outro personagem. E Gabriela é generosa com o colega e sabe que o brilho é dele. Ponto pra ela, que brilha também.

Ary, mestre, querido, um exemplo de diretor e, agora nesta faceta que eu nao conhecia, um excelente ator. Conta para nós um roteiro impossivel de um filme bastante americanizado, mas conta o roteiro como se fosse James, seu personagem, e não como Ary, nosso mago. Papel dificil e defendido com louvor por Ary. Sinceramente? Uma das melhores interpretações até agora. Se ele ganhou o premio Shell como diretor por "Traição", ele merecia uma indicação como ator por "Produto".

Um espetáculo que todos os atores e diretores devem assistir. Uma peça incrivel e obrigatória. Parabéns a toda equipe.

Um comentário:

Rodrigo Monteiro disse...

Olá,
tb fiz a crítica da peça.

Teu blog está no meu... www.teatropoa.blogspot.com


Mas a crítica de Produto, que não é uma peça gaúcha, está aqui:

http://thingsmag.blogspot.com/2010/02/ouvir-se-pelo-contar-se-divertir-se.html

abraços!!