Depois de quase dois meses, entre idas e vindas, a Salvador,
voltei aos convivas cariocas. E, de imediato, me joguei no teatro para ver o
que se passa por aqui. Primeiro, busquei espetáculos que estavam terminando a
temporada, mas que diziam-me ser imperdíveis. E lá fui em busca daquela arte
que mais amo. Parti para o centro do Rio, Teatro Carlos Gomes, para
assistir A Arte da Comédia.
A história da peça é assim: um dono de uma companhia de teatro,
que está às voltas com dívidas por conta de seu espaço que pegou fogo, mas só
conseguiu salvar o figurino e a vida dos atores, corre perigo de ficar à míngua
por falta de palco onde se apresentar, e, assim, ganhar o dinheiro de todo dia.
Ele tem uma idéia: pedir ajuda ao Prefeito novo, que poderá salvar sua pele e
de toda a sua Companhia. Em lá chegando, tenta de todas as formas fazer com que
o Prefeito ceda aos seus apelos, sem sucesso. Mas, recebe uma bênção dos céus:
uma listagem com os nomes importantes a quem o novo Prefeito deve procurar para
ter as alianças sólidas durante seu mandato. (Qualquer semelhança com o que
vemos no legislativo brasileiro, não é mera coincidência). Assim, ele tentará
provar ao alcaide que sua arte vale a pena ser investida pois, se conseguir provar
que as pessoas que chegarem àquele gabinete são atores de verdade, o Prefeito
irá ajudá-lo. Caso contrário, ele está ferrado. Só, que com isto, ele deixa o
Prefeito com a pulga atrás da orelha e começa a desconfiar de todos que entram
em seu gabinete. Pronto. Furdunço geral.
O texto é do italiano Eduardo De Felippo e a fluente
tradução de Macio Aurélio. A linguagem é bastante rica e as piadas inseridas no
texto dão a atualidade da trama. Além do quê, falar sobre a arte da
interpretação é um prato cheio para divertir o público. É um jogo entre a
realidade da política e a realidade do teatro. É um duelo entre aqueles que
acreditam que todo ator é um bon vivant
versus aqueles que vivem seriamente de sua arte.
Sérgio Módena dirige o espetáculo com mãos de ferro. Quase
um balé, de tão coreografado. Sergio consegue tirar do elenco o que cada um tem
de melhor no humor. Oferece ferramentas positivas para que cada um, ao seu
momento, possa brilhar em cena.
A cenografia de Aurora de Campos é muito bonita e apenas o
necessário está no palco, deixando espaços para o elenco mostrar
o seu talento. Um cenário simples, mas muito elegante, de bom gosto e perfeito
para qualquer palco. Um exemplo! O figurino de Antônio Medeiros são bonitos e
harmônicos, assim como a luz sempre bonita de Tomas Ribas.
E é o elenco quem mais se diverte em cena. Alias, um
numeroso e talentoso elenco. Erika Ribas, Alexandre Mofati, Celso André são os
personagens que estão naquela listagem de pessoas importantes: o padre, o
médico, o farmacêutico, a professora. Pessoas que influenciam a opinião de toda
a cidade. Os quatro estão bem a vontade em seus papéis, com Celso André
arrancando gargalhadas da plateia e Alexandre Mofati deixando todos atônitos e
sem piscar com sua presença no palco. Ainda no elenco, Alexandre Pinheiro,
Ricardo Souzedo, Teresa Tostes, Poena Vianna, Saulo Segreto e Sérgio Somene.
O trio que encabeça o espetáculo é composto por André Dias, engraçadíssimo,
inteligente e seguro como o auxiliar do prefeito; Ricardo Blat interpretando o
dono da companhia teatral, também muito seguro do texto e do seu amor à arte; e
Thelmo Fernandes, numa de suas melhores atuações em teatro, fazendo juz à
indicação ao Premio Shell.
Tomara que a peça volte logo aos palcos cariocas. Ainda tem
muita estrada pela frente. É realmente uma homenagem ao teatro, um espetáculo
rico no texto e em interpretações. Voltar ao Rio de Janeiro e ser abençoado com
esta peça, não tem preço! Aplausos de pé.
Fotos de Paula Kossatz
Fotos de Paula Kossatz