segunda-feira, 5 de maio de 2014

O GRANDE CIRCO MÍSTICO


Se tem uma arte que me faz voltar a ser criança é o Circo. Desde pequeno íamos muito assistir aos que chegavam no Rio e se instalavam na Praça Onze. Agora estão na Barra e fica difícil de ir até lá. Desde a primeira vinda do Cirque du Soléil assisti a todas as apresentações. Ali estão reunidos artistas que, usando de sua excelente forma física, equilíbrio, desprendimento quanto aos medos de altura, animais e de morte, fazem tudo para divertir a plateia. Me excita também a arte de mambembar. Cada período em uma cidade. Plateias novas, rosto novos.

Sou completamente apaixonado por palhaços. Coleciono em casa. E tenho um sonho, que nunca contei a ninguém, mas que agora será revelado: quando eu tiver 60 anos, vou procurar um circo e fugirei com ele sendo um dos palhaços. Já até vi o preço na Escola Nacional do Circo, do preço do curso de palhaço. Afinal, toda arte merece estudo!

Entre as comemorações dos 70 anos de Chico Buarque, a produtora Primeira Página traz ao Rio “O Grande Circo Místico” em formato de teatro musical, no Theatro Net Rio (Como é gostoso estar no Theatro Net Rio!). Newton Moreno e Alessandro Toller nos contam uma história de amor entre um espectador e uma integrante de trupe, a bailarina. Soma-se à trama uma invejosa noiva, a guerra que os separa e todo um circo com cavalos, leão, mulher barbada, trapezistas e malabaristas. Tudo isso regado com músicas de Edu Lobo e Chico Buarque. Quer coisa melhor?

João Fonseca, o meu diretor favorito (não escondo...), coloca toda a sua marca no espetáculo. Bom humor, inteligência, competência e criatividade. Destaque para a queda da bailarina do cavalo, as cenas da guerra, a condução da trama, a reunião de todos os integrantes da “trupe” no fim da peça cantando à capela. Tudo de bom gosto e emoção. João se cercou de uma equipe competente. A direção musical e os músicos, a coreografia, a direção de movimentos circenses, toda a extensa equipe merece aplausos.

O cenário do Nello Marrese é um achado! Lindo, criativo, funcional, prático e eficiente. Suas soluções para o circo, enfermaria, a cidade ao fundo, a corda bamba de arame farpado, as caixas-relicários-armários, tudo harmônico, bem construído e o necessário para contar a história. E a surpresa das filhas gêmeas no final da peça? Prêmio Shell já! O figurino de Carol Lobato também competente, colorido quando tem que ser e sóbrio nos momentos da guerra. Luz do Nenén (tive o prazer de trabalhar com ele recentemente) é criativa e bonita.

Os atores estão muito bem selecionados e o conjunto faz um belo trabalho. Ótimos momentos são as músicas cantadas à capela por Fernando Eiras, a mulher barbada de Ana Baird, o solo da música Beatriz de Gabriel Stauffer (que, aliás, emocionou a plateia todas as vezes que entrou no palco com sua verdade cênica), a voz e a beleza da bailarina Letícia Colin, a inveja da mulher não amada na pele de Isabel Lobo e a composição de Lily Browun feita por Paula Flaiban. Gosto também dos personagens de Marcelo Nogueira e Felipe Habib (que, se não me engano, faz o palhaço que abre o espetáculo). Ainda no elenco, Renan Mattos, Thadeu Torres, Leonardo Senna, Juliana Medella, Leo Abel, Natasha Jascalevich, Douglas Ramalho e Luciana Pandolfo.

Mas tenho que destacar o palhaço de Reiner Tenente. Não existem adjetivos que possam aplaudir seu trabalho nesta peça. Uma entrega ao personagem. Ele é “O” palhaço. Dos melhores palhaços que o circo já viu. Apaixonado pela Bailarina, entende o amor da mocinha pelo visitante e se conforma em ter a amizade (outra forma de amor) da sua amada. Destaca-se nas cenas da guerra, enfrenta os problemas da trupe, anima quando é chamado a exercitar sua arte. Canta bem pra caramba. É o grande personagem da peça, sem desmerecer os protagonistas. Reiner Tenente compôs um palhaço, Clown, digno de prêmio. Aguarde, garoto, chegará.


Ouvir “Ciranda da Bailarina”, “A História de Lily Brown” e “Beatriz” num musical de teatro era um dos meus sonhos. Ontem, assistindo à peça, me realizei por vários motivos. Circo, músicas, elenco, palhaços. Voltei a ser criança, mergulhei neste circo e aplaudi de pé e emocionado o final do espetáculo. É difícil, depois de assistir a tantas peças de teatro (em média vou a 2 por semana), não achar tudo já visto, mas em O Grande Circo Místico me desliguei de tudo que já vi e me entreguei à história. É o teatro bem feito, com paixão e vontade de acertar e agradar ao público. Bela homenagem a Chico Buarque, belo trabalho de equipe. Obrigado pela excelente apresentação de ontem. Aplausos de pé.

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